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Empresas querem diálogo com fisco

Laura Ignacio Uma pesquisa realizada pela KPMG International com empresários de multinacionais da América Latina demonstra que a maioria deles acredita ser possível um relacionamento mais estreito entre contribuintes e fisco, como foi proposto pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) no início deste ano. A auditoria entrevistou 138 empresários no período de junho a julho e no levantamento, divulgado no Brasil com exclusividade pelo Valor, 71% disseram estar dispostos a passar mais informações para o fisco se a atitude resultar em regras mais brandas. Com a medida, ganhariam as duas partes, acreditam Marienne Munhoz, sócia responsável pela área de tributação internacional da KPMG no Brasil, e Loughlin Hickey, líder global da prática de tributação da auditoria. As autoridades fiscais, porque poderiam focar as ações de fiscalização nos contribuintes de risco. E os contribuintes, porque teriam condições de reduzir custos, inclusive com ações judiciais contra o fisco, e realizar mais investimentos. "Maior confiança entre as partes levaria a regras mais bem definidas, o que diminuiria os custos das empresas até mesmo com ações na Justiça originadas por causa de regras obscuras", argumenta Marienne. Segundo ela, a forma como o fisco lida com os contribuintes pode atrair ou repelir investimentos para um país - e o momento econômico brasileiro atual, diante da estabilidade, é perfeito para as empresas buscarem mais diálogo com o fisco. "Na KPMG recebemos investidores estrangeiros que estranham não haver um canal de comunicação mais fácil com a Receita para negociar benefícios fiscais, o que é muito comum em países da Europa", diz. De acordo com a pesquisa da KPMG, a maioria das companhias tem críticas em relação ao fisco do país onde atua. Dos entrevistados, 55% disseram que as autoridades fiscais do país não colaboram para garantir às empresas vantagem competitiva frente ao mercado internacional. Para Loughlin Hickey, as leis estão cada vez mais complexas, o que torna cada vez mais caro para as empresas o cumprimento de normas fiscais e tributárias. "Uma maior abertura para conversa com o fisco facilita os negócios para as empresas. Quanto mais se sabe sobre a lei tributária de cada país, mais é possível prever como o negócio irá reagir", diz. Segundo Hickey, na Austrália, é publicado anualmente um documento sobre quais setores serão focados pelo fisco. O líder da KPMG afirma ainda que, recentemente, a Rússia abriu a discussão sobre as regras de preços de transferência com os contribuintes. "Se o contribuinte sabe com antecedência, pode agir melhor para cumprir as regras", diz. A KPMG entrevistou companhias do México, Brasil, Argentina, Chile, Colômbia, Peru e Venezuela. Os empresários chilenos são os que mais acreditam que o fisco do país colabora para o desenvolvimento de negócios (65%). Do Peru, 56% aprovam as autoridades fiscais nesse sentido; da Colômbia, 52%; do México, 38%; do Brasil, 35%; da Venezuela, 28%; e da Argentina, 10%. Para Ricardo Escobar, diretor da Receita Federal do Chile, o percentual entre os chilenos foi mais alta porque a Receita do país desenvolve continuamente medidas para facilitar a vida dos contribuintes. "Há cinco anos, por exemplo, a Receita desenvolveu um sistema em que, pela internet, 98% dos contribuintes, entre pessoas físicas e empresas, podem obter informações sobre sua situação fiscal", diz. Além disso, em alguns casos são realizadas consultas sobre regras tributárias antes de elas se tornarem oficiais junto a empresários. "Já fizemos isso em relação a bancos, por exemplo", diz. "Buscamos conhecer quem são esses empresários e como funciona o negócio deles para poder ajudá-los. Assim, a Receita coleta os impostos com maior rapidez e as empresas podem fazer negócios com mais eficácia", diz. Um dos motivos que afastam investidores de um país é a complexidade da legislação. O levantamento da KPMG revela que 33% dos colombianos acreditam que sua legislação fiscal é compreendida fora da América Latina. O mesmo ocorre com 20% dos chilenos, com 17% dos peruanos, com 14% dos mexicanos, com 6% dos venezuelanos e com 5% dos argentinos entrevistados - o mesmo percentual de 5% foi obtido entre os empresários brasileiros. Daniel Bachner, CFO da Syngenta na América Latina, exemplifica que o fato de a Receita brasileira ter cinco anos para cobrar tributos prejudica os negócios. "Preferiríamos ser fiscalizados antes de encerrarmos o balanço anual", diz. Segundo ele, empresas multinacionais têm que seguir padrões internacionais e a espera de cinco anos para que seja feita a fiscalização dificulta isso. "Além de levar ao aumento de custos como honorários advocatícios para a empresa se defender na Justiça", afirma. A relevância da melhora do relacionamento entre fisco e contribuinte para os negócios foi discutida no Congresso da International Fiscal Association (IFA) desse ano, que ocorreu na Bélgica. O advogado Luiz Gustavo Bichara, que participou do evento, disse que, na Suíça, a Receita responde dúvidas de contribuintes em, no máximo, 15 dias e, na Itália, nenhum processo administrativo pode levar mais de dois anos ou extingue-se o possível débito tributário. "No Brasil, a discussão administrativa pode chegar a 12 anos", contabiliza.
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